Saturday, September 27, 2014


por aí com pinta de fugitivo de hospício. tava apenas pensando no disco novo daquela banda de frisco e nos nomes dos remédios que a gente era apaixonado. juro que não percebi que era mesmo você parada ali na calçada. a cidade toda molhada e brilhando como uma viagem atormentada de ácido. você e os pingos flutuando através da luz elétrica. seu vestido balaçando como uma bandeira branca na borda de uma trincheira. É solitário por esses lados, você me disse. vamos dar uma volta. vamos até aquele bar. onde sempre tem alguém chorando no balcão. aquela paródia de purgatório. onde os cachorros do inferno estraçalham o lixo dos banheiros. eu sei que eu nunca vou conseguir superar a perda da frágil segurança da minha solidão. seus drinques de veneno. seus dentes de leite. seus tênis rabiscados. ri quando você me falou que aquele senhor balança as pernas como uma galinha antes de cagar. caminhamos madrugada adentro num silêncio flamejante. pessoas gritavam das janelas dos edifícios invadidos. foi só quando passamos por baixo do viaduto, sob um intenso brilho vermelho, que eu percebi as lágrimas. um banho de lágrimas encharcando seu rosto com toda a tristeza que existe. as ruas não pareciam nada bem. elas nunca parecem. por isso voltamos sempre para aquele lugar.

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